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O perigo das headlines

Em 2020, a Agência Brasil divulgou a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil e assustadoramente constatou-se que em 4 anos (de 2015 a 2019) o Brasil perdeu mais de 4,6 milhões de leitores. Nossa média é absurdamente baixa – 2,5 livros inteiros por ano e 2,4 de parte de livros. Em nosso país apenas 52% das pessoas leem. Na França, para citar um exemplo, são lidos 21 livros por pessoa por ano.
Em um país com índices de leitura tão baixos, as headlines (manchetes) constituem um verdadeiro risco, considerando que as redes sociais, em especial, as exploram muito bem, causando mais desinformação e confusão do que propriamente um entendimento sobre os diversos assuntos. Vejo que poucas pessoas de fato conseguem ler uma notícia de forma integral, interpretar seu contexto, verificar a veracidade da referida notícia, analisar “o outro lado” antes de sair compartilhando em redes sociais, junto com figurinhas ou palavrinhas, mas sem um sustentáculo daquela suposta informação.
Estamos perdendo a capacidade de argumentar, de conversar sem ofender, de defender um pouco de vista sem atacar e isso tem me preocupado porque ao mesmo tempo que se fala tanto em cultura da paz, o que percebo com mais frequência é uma polarização absurda, tão bem retratada em O Dilema das Redes, disponível no streaming Netflix.
Um país com índices baixos de educação, com poucos leitores é ou não é a oficina do diabo para disseminar tantas fake news?
Falando nele, essa semana lia O Inferno somos nós, de Leandro Karnal e Monja Coen e uma passagem me chamou a atenção: “Paul Valéry, grande poeta e pensador francês, diz uma frase de que gosto muito: A pessoa que julga não vai ao fundo de nenhuma questão. Quando julgamos, interrompemos a capacidade de avaliar, porque estabelecemos um tribunal entre nós e o outro. A partir daí, não o enxergamos mais, porque ele passou a pertencer ao outro lado. Portanto, o julgamento, à parte de qualquer reflexão religiosa, tem uma limitação filosófica. Ele é uma interrupção do raciocínio. A classificação nos impede de sentir, pensar e aprofundar qualquer questão.”
Assim, nesses tempos sombrios que escolhemos apontar culpados em vez de assumir nossa parte da responsabilidade (assumir mesmo, sem fingimento), meu sincero desejo é de que possamos praticar o hábito da leitura. Só através da educação seremos capazes de ir além da superfície para entender o que se passa realmente em nosso cotidiano.
As manchetes são utilizadas pela mídia (editor-chefe, não me interprete mal) como forma de atrair o leitor para a informação contida no corpo do texto, não para ser tomada como conclusão. Não façamos confusão. Retomemos a capacidade de comunicação, interpretação e argumentação. Pelo bem e sobrevivência da sociedade.
Fonte: agenciabrasil.ebc.com.br

Juliana Rebellatto Locatelli

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